Conto pervertido de um quase amor


A melódica canção tocava no computador enquanto Beatriz sentia que Pedro estava chegando ao gozo. Transa temporária, daquelas que se iniciam com um beijo na sala, mas sempre se sabe que terminarão na cama, ou na solidão de passos errantes. Ela se movia para todos os lados e esperava o vulcão jorrar em seu corpo todo o prazer do rapaz viril, que a saciava incessantemente nos últimos minutos. Não era somente pornografia, pois havia também sentimentos naquele ato.

Os corpos se tocavam em barulhos silenciosos que aumentavam o ritmo do pulsar forte dos corações. Uma metamorfose delirante de dois jovens em busca de algo que lhes separasse finalmente. O movimento avançava em velocidade e força a cada segundo. Pedro, como um animal que estrangula a sua presa até que ela dê o último suspiro, metia seu órgão ereto com destreza entre as pernas de Beatriz, que apenas gemia e murmurava palavras incompreensíveis a quem não participava da ação.

A rapidez do vai-e-vem se intensificou ainda mais, tal motor de carro com o combustível em ponto de ebulição. Fervor que evaporava levemente nas costas de Pedro e na face da moça. O contraste estava no que havia de mais singelo na pele branca e suada do rapaz e nas tetas tesas e negras da rapariga iniciante naquele novo sexo, sem pré-determinação de amor. A imagem até se completaria com o som ao fundo, quase romântico e triste na voz chorosa de um cantor qualquer.

Como um solo de guitarra que chega à sua última nota sem deixar terminar completamente a canção, Pedro gozou em breves intervalos intermitentes de excitação. Beatriz também sentiu sua alma largar a terra e vagar por um espaço inexistente em segundos de prazer. Os olhos revelavam o crucial momento em que ambos, talvez um primeiro, chegaram ao ápice daquela cena. Nada mais importava, nem mesmo o fato de terem se conhecido há poucas horas.

Os corpos, lentamente, começaram a sentir a leveza de se ter por inteiro outra vez depois de se perderem por momentos de loucura. Beatriz, meio que sem querer, mas num incontrolável mexer dos lábios, beijou o peito de Pedro e disse baixinho alguma coisa como amor. Talvez tenha sido até mesmo esta exata palavra. Inocente, não sabia que era melhor ficar calada depois do sexo gostoso.

Beatriz quis falar mais de suas emoções, porém o jovem se levantou calado da cama, pegou a roupa, vestiu-se e saiu, deixando-a sozinha em seu quarto solitário de menina-mulher-amante. Partiu também o coração da rapariga, esperançosa de um amor para lhe curar as feridas d’outrora, restando-lhe como companhia apenas a canção melódica que ouviria novamente, quando sentisse saudade da solidão.

Angústia das Tardes de Verão



Os sentimentos não eram muito claros e Tarcísio não se esforçava para entendê-los, apenas sentia. Era algo confuso que lhe vinha ao coração ou à mente, de repente, e bagunçava todas as suas emoções. Uma vontade incontrolável de fugir de tudo e de todos que lhe olhavam na rua. Aqueles olhos a vigiarem constantemente. Mas o pior mesmo eram as vozes que o atormentavam todos os dias antes de o sol se por.

Jovem de boa aparência, aproximando dos 26 anos, ele não gostava de contar a ninguém, além de sua mãe, sobre suas visões de mundos invisíveis. Tinha medo que lhe chamassem de louco ou coisa assim. Não era loucura, apenas uma estranheza ainda sem explicações. Seus medos infantis que permaneciam ao redor, tal sombra para assustar em noites iluminadas pela lua. Sim, pareciam mais mistérios de contos assombrados o seu temor e alucinações.

Naquela tarde quente de sexta-feira, Tarcísio saiu do trabalho e foi caminhar um pouco, para espairecer as ideias. Ele trabalhava como porteiro, já que a vida não lhe dera tantas oportunidades. Na verdade, aquele passeio não planejado fora só mais uma forma de fuga. Há mais de uma semana que ele não dormia direito. Passava as noites em claro revirando-se de um lado para o outro da cama. Estava preocupado com algo, não sabia ao certo o quê, talvez fosse o futuro e suas inconveniências.

Andou por quase uma hora, enquanto ao longo do horizonte o sol corria lentamente para a profundidade do infinito que ele desconhecia. Dessa vez, as vozes não lhe tiraram o sossego. Somente o barulho dos carros na rua é que não o deixava esquecer de si mesmo. Quando já começava a escurecer ele percebeu que as sombras estavam voltando a cercar-lhe. Primeiramente de maneira sutil, depois como se o quisessem carregar. Ele teve medo. Não queria que elas o levassem.

Tarcísio correu desesperado pela rua. Gritava e procurava se esconder. Mas as malditas sombras estavam em todos os lugares, como demônios a lhe perseguirem. Não se entregaria tão fácil. Esbravejava e corria desesperadamente. Só parou quando os anjos de branco se aproximaram e expulsaram os monstros. Sentiu sono e dormiu em paz.

O rapaz acordou sete horas depois, já de madrugada e em casa. A mãe, ao lado da cama, o observava com olhos carinhosos e preocupados. Os problemas do filho sempre ficavam mais intensos nessa época do ano. E ele ainda insistia em não tomar os medicamentos regularmente. Foram três ataques em menos de um mês. Mas ela tinha esperança. Afinal, o verão haveria de ir embora em breve e, quem sabe, levaria consigo as angústias de Tarcísio.