A contemplação transforma o meio. O mundo não está pronto, acabado. Ele sofre modificações através do olhar e da ação humana. As sociedades, os indivíduos, também se transformam, pelo tempo e pela história.
Paro, observo. De repente, percebo que o edifício a minha frente não é o mesmo. Cada vez que os meus olhos se movem, uma multidão entra e sai do prédio. Aos poucos, noto que também a ferrugem o consome. Imenso, imponente; o edifício JK, na rua Timbiras, bem na região central de Belo Horizonte, vai timidamente perdendo a sua beleza.
As pessoas, tenho avaliado bem no meu íntimo, já não mantém uma relação intensa com a cidade. Elas simplesmente passam, e não conseguem ver, por exemplo, a beleza da Praça da Estação, com suas fontes, seus leões e suas marcas. Apenas os pombos é que aproveitam bem esses espaços urbanos.
Fico empolgado ao ver crianças nas praças, a correr atrás de borboletas. Mas me entristece muito ver o descaso com que alguns monumentos, tão belos e cheios de história, acabam esquecidos. As pessoas já não enxergam. E, por isso, o meio não se transforma. Degrada-se. Falta a contemplação para que a história saia das construções e se erga com a sociedade.
ATO II
Depois de parar por alguns instantes ao lado da Praça Sete de Setembro, fiquei a observar como o mundo, ou melhor, as pessoas do mundo, andam depressa. Parecem uma boiada sem vaqueiro a correr desgovernada.
Penso, olhando para a obra que todos chamam de “Pirulito”, como o Ser Humano é louco. Explico. Ele constrói imensos monumentos, como o “Pirulito”, para mostrar a sua força, o seu poder, mas logo que termina a construção e faz uma pequena reverência à obra, deixa-a no esquecimento. Excomunga-a da história, da sociedade. Então, esses prédios, esses concretos, ficam perdidos em meio à multidão. Ao observar mais um pouquinho, tenho a impressão de que os edifícios têm vida própria. Parece que olham para mim. Estão muito solitários.
Eu decidi! Quero domar essa boiada. Fazer com que as pessoas se percebam e notem o mundo a sua volta. Ainda que apenas com as palavras, como um boiadeiro, que em vez do laço usa a caneta, e faz o seu rebanho andar direito. Vou fazer a história com o que a história me coloca a disposição.
Talvez assim, as pessoas também possam parar um instante e ver a vida que cresce junto delas. Essa vida que eu vejo agora, parado ao meio-dia, em meio a tanta confusão, no primeiro dia de um mês qualquer.
ATO III
Fiz tantos planos de um futuro bom. Criei tantas palavras dentro de mim e, agora, todas elas querem sair. Preciso deixar que elas se libertem, que venham ao mundo e façam alguma coisa para os dias serem melhores.
Isso é tudo o que eu desejo nesse momento: promover uma libertação intelecto-cultural dentro de mim. Muito estranho tudo isso, eu sei. Mas é assim mesmo. Nem tudo tem explicação.
Isso é tudo o que eu desejo nesse momento: promover uma libertação intelecto-cultural dentro de mim. Muito estranho tudo isso, eu sei. Mas é assim mesmo. Nem tudo tem explicação.
Quero construir edifícios com a sonoridade das mais serenas palavras. Fazer o mundo girar, com o dedo apontado para o “Horizonte”. Nesta cidade onde os olhos não se vêem e os corpos não se sentem, vou gritar com as letras de um alfabeto extinto.
Caminharei por entre essas pedras ambulantes e construirei, em meio à guerra mercadológica, um presente bom. Como uma promessa. Os planos de dias felizes para sempre. Ou uma grande ilusão.
Admilson Veloso
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