Cálculo astrológico




Débora pegou mais um bombom na caixa ao lado da cama e abriu para devorá-lo, enquanto tentava se concentrar no material de estudos que precisava revisar para a prova do dia seguinte. A ansiedade lhe tomava conta e, como sempre, trazia sintomas paralelos, a exemplo da dor de cabeça. Mas ela tinha que se dedicar, ou não obteria a nota necessária para passar no exame, o último da faculdade antes das merecidas férias.

Cálculo nunca foi o seu forte. No período anterior, livrou-se da disciplina na “tábua da beirada”, como costumava dizer sua mãe. Agora, mais uma vez, aqueles números e fórmulas vinham lhe tirar o sono. Teria que conseguir 23 pontos em 30. Não parece tarefa difícil, mas quando se trata da maldita matemática, tudo pode acontecer. De exato só há o título. Bastaria um descuido para ter que refazer toda a matéria.

Ela abriu o caderno e começou a reler o que havia estudado ao longo dos últimos seis meses. Logo nas primeiras páginas, percebeu alguns rabiscos no canto da folha. Forçou a mente na tentativa de lembrar o que havia escrito. Não era conteúdo referente à aula. “Levar o cartão do Pedro”, em letras pequenas, foi um lembrete feito para ela mesma não se esquecer do presente que iria dar ao novo romance. 

Não rendeu muito. Pedro e Débora eram de signos opostos, sem ascendentes que ajudassem. Pelo menos foi como sua amiga, a mística Fernanda, a ajudou a entender o desandar do caso, após três meses de um quase-namoro. Talvez os astros realmente não tivessem colaborado. Ainda mais com um menino tão avoado quanto ele. Parecia que vivia no mundo da lua o tempo todo.

Ela até que gostava do “ficante”, mas ele tinha um jeito estranho – como boa parte dos estudantes de Humanas - desaparecia e não dava notícias por uma semana. Já Débora era menina carente, daquelas que gostam de presença, presentes e carinho. Tinham se passado dois meses desde que pararam de se encontrar, mas o coração às vezes ainda acelerava ao pensar nele. Mulher tem dessas  coisas. Um dia ou outro tudo se ajeitava no seu devido lugar.

Após as recordações, voltou a direcionar a atenção ao que realmente importava: os estudos. Revisar Cálculo era praticamente uma tortura. Nessas horas ela se perguntava: “porque fui escolher Engenharia¿” Não era a primeira vez que se questionava sobre o assunto. Já tinha pensado em desistir do curso uma vez, só não o fez pela pressão da família.

No fundo, Débora gostava dos números. Era mais fácil lidar com eles do que com as palavras. Pelo menos as contas tinham uma fórmula. Bastava aprendê-la – o mais complicado até então – e, depois, aplicar nos devidos momentos. Seria tão bom se tudo na vida pudesse ser daquele jeito. Imagina se ela conseguisse entender o Pedro apenas utilizando uma calculadora científica! Mas não dava...

Meia hora depois, largou o caderno de lado e resolveu ligar para a Fernanda. Do outro lado da linha, a amiga respondeu prontamente: “Ei Deh, boa tarde!” No tom de voz, conseguiu perceber o estresse da colega. “Você acha que eu deveria ligar para o Pedro?”, perguntou logo de cara. “Claro que não. Porque isso agora?”, cortou as chances. “Nada não, deixa pra lá... Beijos!” Encerrou a conversa e desligou. 

Mal sabia ela que a amiga – e não os astros – tinha sido a razão para o término do principio de relacionamento. Fernanda se envolveu sem querer, mas depois não fez questão de evitar.  O menino tinha aquele ar de nerd, barba por fazer, exatamente como ela gostava. E, no fundo, ele e a Débora não davam muito certo mesmo. A menina era um pé no saco, sonsa, mal a suportava na faculdade. Agora, com ela e o Pedro, a situação era bem diferente. Os dois se encaixavam perfeitamente. 

Ela não conseguia imaginar como ficariam as coisas quando o caso deles fosse descoberto. Na verdade, sua vontade era dar as mãos com o Pedro e sair por aí como namorados. Uma pena ter que esperar a poeira abaixar... Até lá, era torcer para que a outra não suspeitasse de nada e trabalhar para mantê-la longe do garoto. Não dava para correr o risco de deixá-la tentar conquistá-lo novamente. Pelo menos o semestre estava acabando e não precisaria ver a chata diariamente.

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