Tempo de Saudade


No tempo, já se passaram três anos desde que Antônio partiu daquele amor. Foi numa noite do fim de junho, quando o frio ainda fazia tremer os lábios e o céu era estrelado. Mas, no entardecer do dia 29 não foi o vento gelado que assoviava pelas árvores o motivo de seu soluço. No peito, algo lhe dizia que não seriam iguais, nunca mais, os olhares dele e de Raquel. Aquele entrecruzar que bastava para dizer tudo o que sentiam. Partir era seu destino. Partir pra longe, onde o mundo gira mais rápido e o sol não se despede à tarde.

Na área em frente a casa, sentado em seu banquinho de madeira, ele observava o horizonte, como se fosse um leve abandonar da natureza. No cajueiro do quintal alguns pássaros insistiam numa sinfonia desafinada. Tudo inspirava saudade, mesmo antes do adeus. Alguns minutos depois Raquel apareceria, meio tímida, como se quisesse fazer seu último pedido. Não o faria. Ficaram os dois sentados no banquinho a olhar pro alto, a planejar um futuro distante, quando se encontrariam de novo.

Antônio, com seus 17 anos, precisava ir. A capital lhe esperava para os estudos e a formação. Raquel, em sua pureza de 15 anos, também queria seguir estrada afora, acompanhar seu amado. Mas não era tão simples assim. Ela ficaria, com lágrimas nos olhos, a esperar sempre um sinal de regresso. Ele, ainda choraria em seu novo quarto muitas tristezas. O amor muda de cor com os verões.

Na noite do dia 29, Raquel o acompanhou até a rodoviária. Levou uma bolsa, como se nela depositasse todo o seu desejo de não passar o tempo. Caminharam devagar, passos contados na areia da calçada. Depois, um pouco ainda de espera no terminal, onde o ônibus finalmente os separaria. Pelo vidro da janela ele conseguiu ver Raquel, menina formosa de cabelos soltos e olhar ingênuo. Deu um aperto no peito e uma vontade de chorar. Antônio não chorava em público. Sempre que suas lágrimas o sacudiam ele se escondia em algum canto. Mas, naquele momento, não teve como fugir. Chorou em silêncio e deixou que se umedecesse seu rosto, pra lembrar que um dia amou demais.

A madrugada chegou ainda na estrada. Antônio não dormira nada. Tinha ficado a olhar pelo caminho cada árvore, cada estrela perdida naquela escuridão. Foram 500 quilômetros até o sol aparecer por trás das montanhas. O mundo parecia diferente por aquela região. Era mais triste. Ou seria sua tristeza que a tudo inundava? Não sabia ao certo, mas algo era diferente. Pouco mais de 100 quilômetros e ele estaria finalmente em sua nova casa. Lugar onde passaria os próximos dias, meses, anos. A lembrança de Raquel o acompanharia. Porém, novos verões viriam lhe roubar a cor dos sonhos e fazer perder todo o encanto. Ainda restaria, na saudade, uma vontade de amar de um jeito puro. Apenas na saudade. Pois, breve Antônio se formaria homem. Raquel se formaria mulher. Eles não sabem, mas a vida, o tempo e a distância fazem sim os corações se partirem e se juntarem em outros pedaços. Um dia saberão...

4 comentários:

Unknown disse...

Muito real, nem alegre nem triste, só uma dorzinha de recordação de que isto já aconteceu comigo e com tantos outros...
A dor, não sei se é maior, a de quem parte ou de quem fica!
Mas dor maior do que a descrita, a da separação causada pela distância, é a de quem mesmo perto se separam!

Parabéns!
Bom final de semana!

Isabella Mariano disse...

Detesto sentimento de perda e de que deu tudo errado! Detesto.

Mas está maravilhoso o texto, muito bem escrito. Enredo ótimo.

E queeeeeem me dera se meu primeiro amor tivesse sido assim, tão bonito e ingênuo. E olha que ainda estou nos 16.
Beijos.

Anônimo disse...

Você sempre nos surpreendendo, hein Mano....

linda disse...

Amei o q vc escreveu, e gostei mais ainda pq colocou o meu nome...rsrs
Bjss!!!